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"A Assinatura de Todas as Coisas" e "Cidade das Garotas", de Elizabeth Gilbert
Que Liz Gilbert é uma grande escritora não há dúvidas, acontece que sua faceta romancista não me cativou tanto quanto a de autora de não-ficção
Esses dias estava conversando com minha amiga
Tudo começou em meados de 2009 quando, contra todos os meus preconceitos internos, depois de um pé na bunda especialmente doloroso, me peguei lendo “Comer, Rezar, Amar“ apenas para preencher meus dias com algo que não fosse mais lágrimas. Acontece que paguei a língua e amei muito o livro - que não era autoajuda, mas sim a história de uma mulher viajando o mundo em busca da paz interior. Ok, pensando bem talvez seja um pouco autoajuda, mas enfim....
Como já disse antes, e quem me acompanha no Instagram deve lembrar, a escrita de Liz Gilbert, inteligente, engraçada e irônica, me encanta. Após atuar muitos anos como jornalista, ela constrói seus textos com a habilidade dos grandes mestres do jornalismo literário - usa com naturalidade recursos como quebra da quarta parede e um humor que por vezes beira a autodepreciação.
Ela envolve o leitor e cria piadas internas que dão a impressão de que você está conversando com uma amiga de longa data. É algo realmente impressionante se você pensar que seu bestseller se trata do relato de uma mulher que conseguiu passar um ano sabático viajando pelo mundo, uma das coisas menos relacionáveis possíveis.
Assim, por anos acompanhei sua vida pessoal e seus lançamentos como as boas amigas imaginárias que somos. Por algum motivo que não sei identificar, no entanto, não li nenhum de seus novos projetos nesse meio-tempo; parece que sempre tinha algo mais urgente na lista de próximas leituras.
Em janeiro deste ano decidi resolver essa situação e ler “A Assinatura de Todas as Coisas“ e “Cidade das Garotas“ - duas de suas obras pós-”Comer, Rezar, Amar”. E para a minha surpresa, apesar de todo o humor de Liz continuar lá, assim como a escrita sagaz, essa sua versão dedicada a ficção não me cativou tanto. Talvez isso se deva a uma quebra de estrutura muito grande que identifiquei nos dois livros - e que me incomodou bastante.
Em “Assinatura“ acompanhamos a vida de Alma Whitaker, uma botanista brilhante e cheia de dinheiro nos EUA do século XVIII, que está doida para se aventurar pelo mundo, mas está presa na Filadélfia onde cuida de seu pai idoso. Não deixa de ser uma história interessante, mas ao narrar com tanta precisão todos os pormenores da vida da protagonista, fica cansativo - se bem que talvez o estilo agrade os fãs dos épicos de Charles Dickens.
“Cidade das Garotas“, por sua vez, traz um tom muito mais leve ao narrar a vida de Vivian Morris, uma jovem que após ser expulsa da faculdade no início dos anos 1940, vai morar com a tia em Nova York. Acontece que a tia é dona de um teatro e assim mergulhamos junto com a protagonista numa vida boêmia repleta de personagens interessantes na era de ouro do jazz.
Apesar de serem leituras bastante divertidas, e de trazerem como pano de fundo temas importantes, como a libertação sexual da mulher, os dois livros tomam rumos muito inesperados - e até mesmo um pouco sombrios - quando passam da metade. São quebras de estilo e estrutura muito grandes, que exigem um pouco de fé do leitor para continuar. Além disso, os finais de ambos me pareceram apressados, fazendo um contraste grande com o tom tão meticuloso e detalhista do início das obras. A impressão é que Liz cria universos grandiosos e se perde na conclusão dessas histórias.
Posso parecer estar sendo um pouco dura, mas se você me perguntar se leria novos lançamentos da autora, a resposta é com certeza. Seus livros não são candidatos ao Nobel, mas para ser justa, em momento algum eles se propõem a isso. Apesar dos enredos das histórias terem me decepcionado nos romances que li, a graça está em sua escrita cativante e seus diálogos rápidos e sagazes. Se você está procurando uma leitura leve e “feel good”, ou mesmo pensa em presentear alguém, é uma ótima opção.
"A Assinatura de Todas as Coisas" e "Cidade das Garotas", de Elizabeth Gilbert
Sarah, você conseguiu traduzir exatamente o meu sentimento ao ler City of Girls. Fui ler super empolgada, cheia de expectativas que foram super atendidas no início do livro. Mas o jeito que a autora foi desenhando o final do livro me deixou desapontada. Como se fosse outro livro, ou a história de outra personagem, e não a personagem do livro. Acabei a leitura meio desestimulada, mas ainda achando que foi um bom livro.
Ganhei um tempo atrás um romance dela - Sobre homens e lagostas, não li ainda e agora fiquei curiosa porque gosto muito da escrita dela em livros de não ficção também.