"A História Secreta", de Donna Tartt
"Os mortos aparecem em nossos sonhos pois é a única maneira pela qual podemos vê-los. Mas o que vemos não passa de uma projeção, vinda de uma distância imensa, a luz brilhante de uma estrela morta"
Aos vinte e poucos anos, Bunny, um estudante da prestigiada universidade de Hampden, em Vermont, nos EUA, está morto. O acontecimento assusta a pequena população local, que não entende como um jovem de futuro tão promissor possa ter morrido. Mas seus amigos mais próximos sabem exatamente o que aconteceu, pois foram eles mesmos os responsáveis por sua morte.
Descobrimos aos poucos, ao longo das mais de 500 páginas, o motivo do assassinato. O crime, assim como sua motivação e consequências, é narrado em primeira pessoa por Richard Papen, um californiano que cai de paraquedas na cultura por vezes sombria da Nova Inglaterra.
Explico, a região, como o próprio nome sugere, é uma das mais antigas e tradicionais dos EUA, e os costumes são marcados por tradições que podem parecer estranhas para um filho da “ensolarada Califórnia“ como Richard, um narrador não confiável que me lembra muito Nick, de “O Grande Gatsby“.
Querendo deixar seu lar, onde não se dá bem com os pais, Richard consegue uma bolsa de estudos em Hampden, onde é aceito como pupilo de Julian Morrow, um misterioso helenista que é mundialmente conhecido e tem um séquito pequeno e fiel de alunos.
É como se ele fosse aceito no Olimpo. A turma, composta por outros quatro rapazes e uma mulher, é tão fascinante para ele quanto o próprio mestre. São como semideuses, com toda sua glória e defeitos, adoradores de Zeus, o professor.
Os jovens acadêmicos, Francis, Henry, Bunny e os gêmeos Charles e Camilla, são ricos, vindos de algumas das famílias mais tradicionais do país, e excêntricos, não se misturando ao resto dos estudantes.
”Por mais diferentes que fossem, compartilhavam uma certa fleuma, um charme cruel que não era nem um pouco moderno, mas tinha um gélido toque do mundo antigo”, descreve Richard, acrescentando que “eles eram criaturas magnificas“.
O leitor, convidado junto a Richard a participar do seleto grupo de intelectuais, entra num universo paralelo, etéreo, erudito e pastoral.
Assim como no universo da mitologia grega, a beleza tem um papel enorme no enredo do livro, mas tem seu preço. “Beleza é terror. Não importa o que entendemos como belo, estremecemos diante disso”, escreve Tartt.
Logo no começo do livro, que deve agradar aos fãs de “Crime e Castigo“, Richard dá a entender que apesar de ter sido “parcialmente responsável“ pelo crime, ele, assim como seus demais colegas, consegue escapar da cadeia. O grupo, no entanto, não se livra da culpa, que os persegue e vai destruindo aos poucos por dentro.
Os estudantes, apaixonados pela mitologia, acabam se vendo dentro de uma tragédia grega. E, aos poucos, cai o véu do mito e somos capazes de ver além do protagonista, percebendo perigos onde sua boa vontade falha em o alertar.
O narrador não é confiável. Mas apenas na segunda parte da obra entendemos isso. Os personagens vão se revelando o oposto do que nos foram apresentados e se mostraram desde o começo para Richard. Seria tudo parte de um plano?, ele se indaga.
Logo na primeira página sabemos que Bunny está morto, mas não sabemos como e porquê e mesmo após a grande revelação, na metade do livro, continuamos fisgados pela leitura, que tem um ritmo hipnótico, querendo acompanhar os desdobramentos do crime, que, como fica óbvio para o leitor, não passa impune, por mais que Richard acredite que sim.
Que resenha incrível!! Já coloquei o livro na minha listinha de leituras.
Já é minha próxima leitura!