"Açúcar Queimado", de Avni Doshi
“Eu estaria mentindo se dissesse que o sofrimento da minha mãe nunca me deu prazer”
Um dos grandes lançamentos do ano passado no Brasil, “Açúcar Queimado“, da norte-americana de origem indiana Avni Doshi, foi também uma das minhas melhores leituras em muito tempo. E talvez uma das mais difíceis de resenhar.
O romance, finalista do aclamado Booker Prize que foi lindamente editado pela Dublinense, tem uma rara qualidade, muito encontrada no livros de Philip Roth, de causar um turbilhão emocional que beira a sinestesia, quase causando sintomas físicos no leitor. Mas estou me adiantando aqui.
Escrever sobre o relacionamento entre mães e filhas não é nada simples, Elena Ferrante, que o faz com rara maestria, que o diga. A italiana, no entanto, escreve na maior parte das vezes sob o ponto de vista materno.
Doshi, por sua vez, traz o outro lado da história. Em “Açúcar Queimado“, a personagem principal, cujo nome só vamos descobrir após algumas dezenas de páginas, é uma jovem adulta, filha de uma mãe relapsa, tentando fazer o melhor com o que foi feito dela.
Tudo começa quando sua mãe apresenta sinais contínuos de confusão e esquecimento e é diagnosticada com Alzheimer. A protagonista se vê então na ingrata posição de cuidar de quem nunca cuidou dela.
“Eu estaria mentindo se dissesse que o sofrimento da minha mãe nunca me deu prazer“, revela, numa das mais célebres aberturas de romance que já li, que já te fisga nos primeiros parágrafos.
“Sofri em suas mãos quando criança, e qualquer dor que ela viesse a sentir depois disso me parecia uma espécie de redenção – o universo encontrando seu equilíbrio, onde a ordem racional de causa e efeito se alinhava”.
Ao ajudar sua mãe a recordar do passado, numa tentativa de atrasar o processo de perda de memória, a protagonista se vê diante de um passado do qual custou a escapar.
Ela agora tem uma decisão a tomar. Pagar na mesma moeda ou ser a mãe que nunca teve.
Leia um trecho do livro aqui
Ps. “Açúcar Queimado“ veio no clube de assinatura de livros de ficção “Histórias Irresistíveis“, da Livraria Dois Pontos. Eu recomendo demais — e não, isso não é um publi.
Estou louca pra ler esse livro... Mas a listinha de livros acumulados aqui tá complicada!!
Amei a resenha ;)