"Escritores e Amantes", de Lily King
"Eu acho extraordinário que você acredite que tem algo para dizer"
"Escritores e Amantes", de Lily King, pode dar uma sensação de deja vú para quem leu “A Idiota“, da Elif Batuman, e isso não é nada mau.
O livro, um dos grande sucessos do mercado editorial norte-americano dos últimos anos, conta a história de Casey Peabody, uma jovem escritora que lida com o luto da morte da mãe em sobreposição a tristeza pelo término de um relacionamento que por um tempo foi uma espécie de fuga de sua realidade.
A realidade, no caso, é que ela vive num puxadinho, pagando um valor quase simbólico a um amigo de seu irmão. Ela passeia com seu cachorro, ao qual nem se dá o trabalho de saber o nome, para abater uma parcela da taxa. Escreve pelas manhãs e trabalha como garçonete durante o restante do dia. Mas nem assim consegue bancar algumas de suas necessidades mais básicas, como cuidado médico. Ou a imensa dívida financeira assumida para pagar seus estudos.
Aos 30 e poucos anos ela vê um a um de seus ex-colega do curso de escrita criativa trocarem a literatura por formas mais fáceis - e “adultas” - de ganhar a vida. Casey se sente como o último soldado no front e começa a se questionar se essa é a decisão mais sábia.
Nesse meio tempo, a jovem escritora se envolve com um brilhante autor e professor viúvo e em paralelo com um de seus alunos - um aspirante a escritor tão fodido quanto ela.
Quando seu locador avisa que irá vender a casa, ela se vê tendo que decidir, após tanto tempo de postergação, quais os melhores rumos para sua vida.
Sim, parece que todos os aspectos de sua vida estão em crise, algo que pode deixar o leitor mais sensível à beira de um ataque de ansiedade - como aconteceu comigo. Uma sensação muito parecida, apesar de ser causada por motivos diferentes, com a que tive ao ler “Dias de Abandono”, da italiana Elena Ferrante. E essa comparação mostra a força de sua escrita.
“Escritores e Amantes“ é uma espécie de romance de formação tardio - algo que cada vez faz mais sentido nos tempos atuais, afinal você com certeza já deve ter ouvido “os vinte são os novos trinta“.
Assim como no livro de Batuman, a autora narra a jornada de uma protagonista perdida e indecisa numa Boston universitária de meados dos anos 1990.
Outro ponto em comum é uma escrita surpreendentemente envolvente; o livro parece escrito como se não houvesse esforço algum da autora - o que nos faz pensar o quanto da história teria tons autobiográficos.
Em suma, o livro fala não apenas da experiência de navegar a existência como uma jovem mulher num mundo que parece ter se virado contra ela, mas também como alguém cuja vocação, escrever, não recebe a atenção que merece da sociedade.
A Casey que encontramos no início do livro não é a mesma da qual nos despedimos em seu final. E essa transformação é uma delícia de testemunhar.
esse tá super na lista ;)