(Especial) “Caderno Proibido”, de Alba de Céspedes - Colaboração de Catharina Mattavelli (@umcantotodomeu)
A Catharina Mattavelli (@umcantotodomeu) é uma das criadoras de conteúdo que eu mais gosto de seguir no Instagram. Se continuo naquela rede social que ultimamente tem me feito mais mal do que bem, é para ver as dicas que pessoas como ela andam postando por lá.
Por isso fiquei tão feliz quando a Catharina anunciou nessa semana que havia entrado para o mundo dos substackers literários, que particularmente acho muito mais bacana do que o universo tóxico da rede vizinha.
Para dar um gostinho para vocês do que eu estou falando, segue uma resenha da Cath sobre um livro lançado recentemente no Brasil, mas que vem chamando a atenção de leitoras ao redor do mundo já há décadas, “Caderno Proibido“, de Alba de Céspedes. Fun fact: ele tem como uma de suas maiores admiradoras ninguém menos do que Elena Ferrante.
Espero que curtam muito a resenha e não se esqueçam de acompanhar o trabalho na Catharina na newsletter “Um Canto Nosso“.
Eu já esperava me impressionar com “Caderno Proibido” por ser indicado na lista de favoritos de Elena Ferrante (você pode conferir a lista completa aqui), inclusive, durante a leitura, é possível notar o quanto a autora contemporânea se inspirou em Alba de Céspedes. Mesmo a obra tendo sido lançada há 70 anos, a forma de pensar acerca das múltiplas camadas do feminino, segue atual. Alba também era italiana e foi uma das líderes do movimento feminista que transformou a literatura e a vida italiana ao longo do século XX, além de se envolver com pautas antifascistas.
Roma, anos 50. Valeria Cossati é dona de casa, mãe, esposa e funcionária de escritório. Quando um caderno entra em sua rotina, torna-se ávida pela escrita, que a faz reavaliar toda a sua vida pela caneta e o silêncio, se rebelando contra as imposições implícitas. Através do caderno proibido, a protagonista exercita a autoanálise questionando a relação conturbada com os filhos; reitera as próprias queixas, cansaços e desejos que nem imaginava guardados dentro de si. A experiência com o diário é o que a move, uma forma de sobrevivência e necessidade que a atrai e a intimida, bagunça a monotonia do seu cotidiano, antes tão natural.
Valéria acoberta sua vida íntima, inteligência e lucidez. Subestimada pelas tarefas domésticas, a família recusa-se a enxergar essa mulher como um ser de complexidades e necessidades. É o caderno que leva Valéria a entrar em embate com a rotina cheia de regras e convenções, questionar o tradicionalismo enraizado e perceber frustrações recalcadas da vida privada, do casamento, da sobrecarga doméstica e o amor romântico com o marido que a enxerga apenas como uma mãe para seus filhos.
Alba de Céspedes revela as contradições da protagonista e as diferenças geracionais com a rigidez do conservadorismo que seus filhos remam contra, como um espelho dos próprios pensamentos que Valéria deposita no caderno, mas não ousa colocar em prática. Sua parte oculta que enxerga sentido e prazer em estar sozinha, em ser uma peça primordial para o trabalho no escritório, que gosta de não estar com a família e ter suas individualidades secretas, ao mesmo tempo quer ser a melhor mãe e esposa, sustentar as expectativas sociais que depositam nela.
Um ser dividido que antes escondia, rejeitava e subestimava tanto de si, para depois de muita relutância, aceitar o mergulho no próprio "eu" que somente a escrita e a solidão são capazes de oferecer. Uma transgressão que a conduz por um caminho da autodescoberta que, uma vez iniciado, não pode mais ser interrompido. Diferente do que a família pensa, Valéria está vivíssima e quer sentir tudo que o mundo tem a lhe oferecer.
Amei Caderno Proibido. Um livro que consegue ser forte com palavras suaves.