"Gabo e Mercedes: Uma despedida", de Rodrigo García
"Preciso falar com minha mãe e confirmar seus piores temores: o homem que foi seu marido por mais de meio século é agora um doente em estado terminal"
O cineasta Rodrigo García sabia que qualquer coisa que escrevesse sobre a história de seus pais, o ganhador do Nobel Gabriel García Márquez e sua companheira da vida toda, Mercedes, seria publicado. E no fundo eu sabia disso também e por esse motivo comecei a ler o livro sem maiores expectativas. Sendo filho de um dos gigantes da literatura do século XX, não pensei que o raio da boa escrita cairia duas vezes na mesma família. Eu estava enganada.
Rodrigo escreve com tamanha sensibilidade sobre sentimentos tão complexos como a perda dos pais que só consigo comparar à “Ridícula Ideia de Nunca Mais te Ver“, de Rosa Montero - quem me acompanha há mais tempo sabe o quanto estimo esse livro. Na obra, a espanhola escreve sobre a perda de seu companheiro de muitos anos e sobre o próprio conceito do luto de uma forma tão clara e sensível que nunca vi outra pessoa fazer.
Como disse antes, não é nada fácil falar sobre a morte, especialmente dos nossos pais, sejam eles mundialmente famosos ou não. E Rodrigo faz isso com extrema delicadeza e habilidade. Em pouco mais de 100 páginas sentimos que ele consegue escrever lindamente tudo que poderia ser dito sobre o assunto.
Quem fala é um narrador que não cai nas armadilhas de se gabar das origens famosas, mas, ao contrário, nos leva ao mundo íntimo de Gabo. Nos sentimos quase parte da família lendo relatos sobre seus últimos dias, a demência que o acomete no final da vida e a doença quase fulminante que o leva em poucas semanas.
Gabo, a pessoa que existia por trás do escritor, era encantador, e isso fica claro na visão transmitida pelos olhos do filho, mas não deixava de ter defeitos e ser profundamente humano. Ler sobre momentos de sua trajetória que vão desde cômicos e leves até reflexivos e tristes - e por vezes com toques do mesmo realismo fantástico do qual o escritor era adepto - nos faz sentir em casa na famosa residência dos García Márques na Cidade do México.
Terminei a leitura com lágrimas nos olhos, não de tristeza, mas de gratidão por ter tido esse relato em mãos. Não se trata de memórias, mas sim de uma carta de amor e uma despedida, como o próprio título já nos avisa.
To louca pra ler, amiga ❤️