"Meu nome era Eileen", de Ottessa Moshfegh
“Eu queria matar meu pai, mas não queria que ele morresse”
Alguns livros te fisgam com um enredo super elaborado. Outros se passam quase que completamente apenas na cabeça de seus protagonistas; esses, quando bem escritos, tendem a ser meus favoritos, como no caso de “Meu nome era Eileen“, da norte-americana de origem iraniana Ottessa Moshfegh.
A mulher que dá nome à obra, Eileen, vive numa cidadezinha na região da Nova Inglaterra, nos Estados Unidos - uma das mais antigas e tradicionais do país. Narrado em primeira pessoa, ela deixa claro que era uma jovem completamente normal, daquelas que o espectador provavelmente nem repararia dentro de um ônibus.
Por dentro, no entanto, Eileen é tudo menos convencional. As reflexões sobre sua timidez, ou melhor, sobre a falta de interesse na companhia das pessoas da região, e sobre o corpo humano e suas funções são algumas das partes mais fascinantes do livro, especialmente por conta da ironia contida nelas.
Aos poucos somos tomados por esse universo particular criado tão habilmente por Moshfegh. Obrigada a largar a faculdade quando sua mãe adoece, Eileen agora trabalha num reformatório para jovens delinquentes, num emprego que o pai conseguiu de favor, e se vê sem perspectivas de futuro.
Conforme Eileen relata as histórias de alguns desses jovens e colegas de trabalho, vemos em suas opiniões características que refletem faces da própria personagem. E que ela mesma parece não perceber.
O pai, por sua vez, é figura central da trama. Alcóolatra e machista, um ex-policial paranoico, sofrendo com uma doença mental não identificada, que desconta toda sua raiva na filha, tornando a vida de ambos um inferno.
Esse é seu principal dilema, ela explica. “Eu queria matar meu pai, mas não queria que ele morresse”.
Sabemos desde o começo que algo irá acontecer e que resultará na fuga/libertação de Eileen, mas não temos conhecimento sobre em que condições isso se dará ou qual será o estopim que finalmente trará coragem para a protagonista.
A trama se passa ao longo da semana de Natal e mesmo que as cenas de ação sejam escassas, a habilidade de escrita da autora nos prende às páginas do livro, que alterna entre passado e futuro de forma quase imperceptível.
O livro é narrado pela Eileen que já está na faixa de seus 70 anos, uma senhora idosa bem resolvida que revê os fantasmas e traumas do passado. Ao comparar as duas versões fica claro como ter fugido de um pai abusivo fez bem para ela.
Após páginas e mais páginas com a sensação de uma contagem regressiva, o estopim para sua fuga finalmente acontece e é muito mais triste e revoltante do que esperava. Não se trata de um grande amor, como a autora dá a entender por um momento, mas um caso de abuso revoltante e difícil de ler.
Desde o começo sabemos que Eileen agora é livre, mas quando ela finalmente consegue escapar da estrutura que a oprime, tomando as rédeas da sua história, é um momento sublime e arrebatador.
Moshfegh já é conhecida do público brasileiro pelo livro “Meu Ano de Descanso e Relaxamento“, editado pela Todavia, que foi um sucesso na Internet.
“Meu nome era Eileen” recebeu o prêmio Hemingway Foundation/ PEN e foi finalista do aclamado Booker Prize.
Que resenha! Agora fiquei louca pra ler. Você arrasa, amiga
Mais uma resenha maravilhosa! Vi a capa desse livro algumas vezes, mas nunca me chamou a atenção de verdade. Mas amei tanto a resenha que já coloquei ele aqui na lista, que inclusive, só aumenta a cada posta hahaha.
Beijo!