"Confiança", de Hernan Diaz
"Deus é a resposta mais desinteressante para as perguntas mais interessantes"
Não foi por acaso que "Confiança", do escritor argentino Hernan Diaz, levou recentemente o Pulitzer de Ficção e foi um dos finalistas do Booker Prize de 2022, dois dos mais conceituados prêmios da literatura mundial. O livro traz em si não apenas um romance, mas também uma autobiografia, uma biografia e um diário - todos narrando a mesma história, mas de pontos de vista muito diferentes. Uma das maiores graças dessa leitura é ir compreendendo e ir se perdendo nesse labirinto que Diaz tão habilmente monta.
Apesar de ter sido lançado por aqui pela Intrínseca sem muito barulho, o livro conquistou, além de diversas premiações, como já citei acima, os corações de críticos e colegas de escrita - a obra foi elogiada por Roxane Gay, Jacqueline Woodson, Rachel Kushner, Lauren Groff e Alberto Manguel, só para citar alguns nomes.
Em “Confiança“, a história de um controverso multimilionário norte-americano inspirado em figurões como os Vanderbilt ou Rockfellers é contada por diversos pontos de vista. Seu clímax é o casamento do protagonista e a forma como ele consegue não apenas se safar da crise de 1929, como ter bastante sucesso financeiro com a desgraça alheia - transformando a admiração ao redor de seu nome em ódio.
Apesar de não conseguir imaginar uma premissa que me interesse menos, dezenas de resenhas elogiosas me fizeram dar atenção ao livro, e já nas primeiras páginas fui completamente fisgada.
Diaz tem uma escrita extremamente cativante, mas o livro fascina o leitor sobretudo ao fazer uso da metalinguagem de uma forma natural e límpida, sem cair na tentação de fazer exageros ou se explicar demais.
"Um dos meus principais objetivos com esse livro era explorar como a verdade é algo instável, resultado de uma negociação", explicou o escritor em entrevista exclusiva ao jornal “Folha da São Paulo”.
Como num cristal multifacetado, esses diversos livros dentro de uma só publicação mostram os diferentes lados e versões de uma mesma história. Gradualmente, cada nova narrativa enriquece os personagens e sua trajetória - tanto suas glórias quanto os erros e segredos que tentaram para sempre manter enterrados.
"Mais que estabelecer qual a verdade dos fatos, eu quis explorar como uma coleção de fatores discursivos produzem efeito de veracidade. Como todas essas vozes flutuam em torno de um lugar de verdade — que talvez esteja vazio", acrescentou o autor na mesma entrevista.
O que mais me admirou é que nas diferentes partes do livro, que na história teriam sido escritas por diversas pessoas, usam de fato linguagens completamente heterogêneas, mas não deixam nunca de resultar em leituras extremamente fluidas.
Os temas abordados no livro, como a riqueza excessiva durante a era do jazz em Nova York, rendeu algumas comparações a “O Grande Gatsby”. Algo que não vejo, pois falta um pouco do cinismo da crítica social de F. Scott Fitzgerald, e é uma ligação que o próprio autor nega. Encontro no texto de “Confiança” muito mais de Edith Wharton e as miudezas e mesquinharias das altas classes sociais que ela costumava abordar.
Em tempo, o livro teve seus direitos comprados pela HBO para virar uma série protagonizada por Kate Winslet, ainda sem data de lançamento.
comecei o ano lendo esse e que leitura!! agora vejo que foi um bom presságio pro restante de 2023. pensando aqui em ql livro vai abrir os caminhos de 2024.
PS: falando de Booker, não deixe de ler Prophet Song, o ganhador de 2023. Um dos melhores livros que já li na vida! Poético e avassalador, daqueles que quando termina, da vontade de começar de novo sabe?! Rsrs...